domingo, 26 de fevereiro de 2012

Lua, Vénus, Júpiter e outras maravilhas celestes

Vénus, Júpiter e a Lua convergiram ontem nos céus crepusculares para formar um brilhante triângulo escaleno. O espectáculo serviu de pretexto para um passeio familiar até às falésias do Guincho, local onde também pudemos desfrutar de um bonito pôr-do-sol. Durante quase uma hora apontei a minha máquina fotográfica ao Sol, ao trio planetário e a outros alvos celestes. Deixo-vos aqui algumas das muitas fotografias tiradas ontem por mim.

Pôr-do-sol visto a 25 de Fevereiro de 2012, a partir das falésias da praia do Guincho.
Crédito: Sérgio Paulino.


Um disco solar ovalado, um fenómeno óptico resultante da refracção provocada pela atmosfera junto ao horizonte. A espessa neblina que ontem se concentrava junto ao mar criou um filtro natural que permitiu também a observação da maior mancha solar actualmente visível no Sol, a AR1423.
Crédito: Sérgio Paulino.


Vénus e a Lua separados no céu por apenas 3,5º. Reparem como é visível na imagem a face nocturna da Lua iluminada pelo brilho da Terra.
Crédito: Sérgio Paulino.


O trio Júpiter, Vénus e a Lua.
Crédito: Sérgio Paulino.


Orionte, o caçador. Esta é a mais brilhante constelação visível nesta altura do ano logo após o pôr-do-sol.
Crédito: Sérgio Paulino.

Caso não tenham assistido ao espectáculo de ontem, terão nova oportunidade hoje, logo a seguir ao pôr-do-sol. O arranjo será, no entanto, um pouco diferente. A Lua estará mais próxima de Júpiter, e Vénus completará o triângulo no vértice mais distante. Os dois planetas estão entretanto a convergir para uma conjunção que se concretizará a 15 de Março, quando estiverem separados por apenas 3º.
Nos próximos dias podem ainda tentar encontrar o planeta Mercúrio logo após o pôr-do-sol. O planeta fará a sua máxima elongação a 5 de Março, a 18º do Sol. Esta será, no entanto, uma tarefa difícil pois Mercúrio estará mergulhado no brilho do céu a poente. Por fim, espreitem o céu a nascente uma hora após o Sol mergulhar no horizonte e poderão encontrar o planeta vermelho. Marte estará em oposição no próximo dia 3 de Março.
Aproveitem o bom tempo e divirtam-se a observar o céu. O espectáculo é inteiramente gratuito.

quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

Misteriosos visitantes nas noites de Fevereiro

A Terra tem estado a receber visitas inesperadas durante todo o mês de Fevereiro. Durante as últimas semanas, grandes rochas espaciais têm colidido com a atmosfera terrestre, produzindo bolas de fogo particularmente brilhantes. Só nos EUA foram registados cerca de 6 destes fenómenos. A mais mediática foi sem dúvida a espectacular bola de fogo que no dia 1 de Fevereiro surpreendeu várias centenas de pessoas na região central do Texas.
Não é o número de bólides que tem sido invulgar neste mês. De facto, não se registou qualquer alteração significativa na frequência destes fenómenos durante todo o mês de Fevereiro. Na verdade, estes objectos têm-se destacado pela sua aparência, velocidade e trajectória. "Estas bolas de fogo atingem o topo da atmosfera com velocidades inferiores a 15 km.s-1, desaceleram rapidamente, e mantêm alguma integridade até 50 km acima da superfície terrestre", explicou ao Science@NASA Peter Brown, professor de Física da University of Western Ontario e especialista em meteoros.
Até agora, as câmaras do All-Sky Fireball Network registaram em território norte-americano cerca de meia dúzia de bolas de fogo com características semelhantes. Todas foram produzidas por grandes meteoróides, com dimensões que variam entre as dezenas de centímetros até ao tamanho de um autocarro.
A determinação das respectivas órbitas revelou algo surpreendente. "Partem todas da Cintura de Asteróides, mas não de um único ponto" explica Bill Cooke do Meteoroid Environment Office. "Não existe uma origem comum para estes objectos, o que é algo intrigante."

Sumário dos dados obtidos pelo sistema de vigilância do All-Sky Fireball Network para uma das invulgares bolas de fogo observadas este mês.
Crédito: NASA.

Não é a primeira vez que tais objectos fazem a sua aparição na Terra. Desde a década de 60, astrónomos amadores têm testemunhado um crescente número de bolas de fogo muito brilhantes penetrando fundo na atmosfera nas noites frias de Fevereiro. Nos anos 90, o astrónomo Ian Holliday analisou fotografias de centenas de bólides obtidas nas duas décadas anteriores. Holliday concluiu que deve existir um fluxo de meteoróides a intersectar a órbita da Terra nesta altura do ano. Os seus resultados possuem, no entanto, grandes incertezas estatísticas, pelo que permanecem controversos.
Espera-se que as imagens obtidas pela rede de câmaras do All-Sky Fireball Network possam esclarecer em breve este interessante enigma. Até lá espreitem o céu nas próximas noites. Quem sabe? Talvez assistam à chegada de mais um destes misteriosos visitantes do espaço.

quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

Um eclipse no Carnaval

A Lua passou ontem, ao início da tarde, na frente do Sol, produzindo um eclipse solar parcial apenas visível a partir do espaço. Felizmente, durante cerca de 100 minutos, o Solar Dynamics Observatory (SDO) esteve posicionado numa região favorável à observação deste fenómeno. Vejam estas belas imagens registadas pelo instrumento Atmospheric Imaging Assembly em diferentes comprimentos de onda:

Trânsito lunar visto a 21 de Fevereiro de 2012 pelo Solar Dynamics Observatory em ultravioleta extremo (AIA canal 171 Å).
Crédito: SDO (NASA)/AIA consortium.

Trânsito lunar visto a 21 de Fevereiro de 2012 pelo Solar Dynamics Observatory em ultravioleta extremo (AIA canal 304 Å).
Crédito: SDO (NASA)/AIA consortium.

Trânsito lunar visto a 21 de Fevereiro de 2012 pelo Solar Dynamics Observatory em ultravioleta (AIA canal 4500 Å).
Crédito: SDO (NASA)/AIA consortium.

Vejam também este vídeo que reproduz todo o fenómeno numa variedade ainda maior de comprimentos de onda:


Sempre que o Sol e a Lua se alinham com o SDO, a equipa da missão fica com uma oportunidade valiosa para calibrar os sistemas ópticos do observatório. A fina silhueta da Lua projectada no disco solar permite aos cientistas rastrear e corrigir defeitos instrumentais que possam degradar a qualidade das imagens.

domingo, 19 de fevereiro de 2012

A paleta de Amaral

Fim de tarde na cratera Amaral. Imagem obtida pela sonda MESSENGER a 04 de Fevereiro de 2012.
Crédito: NASA/Johns Hopkins University Applied Physics Laboratory/Carnegie Institution of Washington.

Os cumes dos picos centrais da cratera Amaral brilhavam intensamente à luz do Sol vespertino quando a sonda MESSENGER obteve este magnífico retrato. Observada pela primeira vez durante a primeira passagem da sonda da NASA por Mercúrio, Amaral atraiu a atenção dos investigadores da missão pela sua curiosa paleta de cores (bastante proeminentes nas composições em cores falsas). Os seus picos centrais destacavam-se particularmente pela sua cor relativamente azulada em comparação com o terreno envolvente, uma tonalidade que muito se assemelha à observada nos picos centrais de Eminescu, locais onde foram identificados impressionantes conjuntos de cavidades. Não se sabe ainda se Amaral exibe estruturas semelhantes às de Eminescu, mas os cumes brilhantes dos seus picos centrais parecem denunciar a sua presença.

A superfície de Mercúrio fotografada pela sonda MESSENGER em cores falsas, durante a sua primeira passagem pelo planeta em 2008. As diferentes tonalidades representam diferentes composições minerais. Estão identificadas na imagem a bacia de impacto de Caloris e as cratera Amaral, Eminescu e Raditladi. As três crateras exibem no seu interior uma forte tonalidade azulada, que se correlaciona em Eminescu e Raditladi com estranhas depressões brilhantes conhecidas pelos investigadores da missão por "cavidades".
Crédito: NASA/Johns Hopkins University Applied Physics Laboratory/Carnegie Institution of Washington (apontamentos de Sérgio Paulino).

Amaral recebeu o seu nome em honra à pintora brasileira Tarsila do Amaral (1886 - 1973), figura central da primeira fase do movimento modernista brasileiro. São da sua autoria algumas das obras mais aclamadas da arte latino-americana (vejam aqui algumas das obras mais famosas).

sábado, 18 de fevereiro de 2012

Um antigo cataclismo em Sudbury

Tenho um amigo que viveu grande parte da sua infância numa pequena cidade do sudeste de Ontário, Canadá. No outro dia perguntei-lhe se alguma vez tinha visitado Sudbury (uma cidade localizada a algumas centenas de quilómetros a norte), e se sabia algo sobre o seu curioso passado geológico. Ele respondeu-me que tinha passado por lá há alguns anos, mas que não sabia nem tinha notado na altura qualquer vestígio invulgar na paisagem.
De facto, quem visita Sudbury não imagina que os seus edifícios foram erigidos sobre a cicatriz de um dos mais violentos impactos ocorridos na Terra. Actualmente com pouco mais de 150 mil habitantes, a cidade deve o seu florescimento à exploração mineira dos vastos depósitos de Ni (níquel) existentes no seu subsolo. Descobertos nos finais do século XIX, os depósitos de minério de Sudbury albergam as maiores reservas mundiais de Ni e Cu (cobre) do mundo. No entanto, os recursos minerais da região não se limitam apenas a estes dois metais. Nas minas de Sudbury foram já extraídas quantidades apreciáveis de Co (cobalto), Au (ouro), Pt (platina), Pd (paládio), Rh (ródio), Ru (ruténio), Ir (irídio), Ag (prata), Se (selénio) e Te (telúrio) (para mais informações sobre os recursos minerais de Sudbury, ver aqui).

A bacia de Sudbury. A rosa está representada a área metropolitana da cidade de Sudbury. O lago Wanapitei, localizado a leste, é uma segunda cratera de impacto, formada posteriormente ao evento de Sudbury, há cerca de 37 milhões de anos (Eoceno).
Crédito: Atlogis (adaptado por Sérgio Paulino).

No seu conjunto, os depósitos de minério de Sudbury distribuem-se na periferia de uma unidade geológica ovalada conhecida por Complexo Ígneo Eruptivo de Sudbury. Esta estrutura é contemporânea de uma segunda unidade mais exterior constituída por brecha, que delimita uma bacia elíptica com cerca de 60 km de comprimento. Esta bacia é tudo o que resta na superfície do evento catalísmico que assolou a região há 1,85 mil milhões de anos (segunda metade da Era Paleoproterozóica).

Brecha fotografada na bacia de Sudbury.
Crédito: LPI.

Com uma diâmetro original estimado de 190 a 260 km, a bacia de Sudbury foi esculpida pelo impacto de um asteróide com 10 a 15 km de diâmetro. A sua actual forma elíptica é resultado da deformação da crusta terrestre ocorrida na região durante as últimas fases da Orogenia Penokeana (um dos mais importantes episódios geológicos ocorridos na América do Norte). O impacto foi de tal forma violento que espalhou ejecta por uma área superior a 1,5 milhões de km2 (foram encontradas brechas provenientes de Sudbury em locais tão distantes como o norte de Minnesota, nos EUA).
Na altura, os continentes eram vastas superfícies áridas, mas nos oceanos e nas regiões costeiras a vida florescia. A Terra era ainda um planeta relativamente jovem e a vida dava os seus primeiros passos num ambiente ainda hostil. Nas águas pouco profundas cresciam os estromatólitos, estruturas formadas por carbonato de cálcio, erigidas por grandes colónias de cianobactérias, organismos vivos fotossintéticos dominantes em grande parte da Era Paleoproterozóica (2,5 a 1,6 mil milhões anos atrás).

sexta-feira, 17 de fevereiro de 2012

A escala do Universo

Encontrei esta espectacular infografia no blog da Sociedade Planetária e não resisti a publicá-la aqui. Compara as dimensões de vários objectos desde partículas subatómicas como os neutrinos e os quarks até às dimensões do Universo observável. Para verem as diferentes escalas apenas têm que movimentar a barra de baixo. Podem também obter informações acerca de cada objecto clicando na respectiva imagem.
Surpreendentemente, esta animação em flash foi criada por dois gémeos com apenas 14 anos de idade! Podem ver mais alguns trabalhos da sua autoria aqui.

quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

A azáfama diária no Observatório Keck

Como será um dia normal de trabalho num dos maiores observatórios astronómicos do mundo? A resposta está neste vídeo criado por Andrew Cooper, engenheiro no Observatório W. M. Keck, em Mauna Kea, Hawaii.

sábado, 11 de fevereiro de 2012

Estará a rotação de Vénus a abrandar?

Dados recentemente obtidos pela Venus Express revelaram que o período de rotação de Vénus é agora 6,5 minutos mais longo que o medido no início dos anos 90 pela sonda americana Magellan. Esta intrigante diferença foi detectada pelos cientistas da missão europeia depois de verificarem que as estruturas geológicas que estudavam não se encontravam exactamente na posição esperada.

Animação mostrando a rotação de Vénus, um planeta com massa e diâmetro semelhantes à Terra, mas com uma atmosfera esmagadora, nuvens de ácido sulfúrico e uma temperatura superficial superior a 460ºC.
Crédito: ESA/C. Carreau.

Usando dados obtidos pelo instrumento VIRTIS (Visible and Infrared Thermal Imaging Spectrometer) da Venus Express, investigadores da ESA descobriram que pontos específicos da superfície venusiana se encontravam deslocados cerca de 20 km em relação aos locais onde deveriam estar, tendo em conta o período de rotação calculado há quase duas décadas pela Magellan. Cerca de 4 anos e meio na órbita do planeta permitiram à sonda da NASA determinar com extrema precisão a duração do dia venusiano, fixando-o em 243,0185 ± 0,0001 dias terrestres. Agora, quase 18 anos após a Magellan ter concluído a sua missão, dados obtidos pela Venus Express indicam que o período de rotação de Vénus se estendeu em média por mais 6,5 minutos.

Representação artística da sonda europeia Venus Express na órbita de Vénus.
Crédito: ESA.

O que terá provocado o abrandamento da rotação de Vénus? A resposta poderá estar na densa atmosfera do planeta. Com mais de 90 vezes a pressão registada na superfície da Terra e com a presença de ventos velozes nas camadas mais altas, a atmosfera venusiana exerce uma fricção considerável na superfície, fricção essa capaz de alterar o período de rotação. No nosso planeta, os ventos e as marés produzem um efeito semelhante, provocando a cada ano oscilações sazonais no período de rotação terrestre em cerca de 1 milissegundo. A variação observada pela Venus Express é, no entanto, demasiado elevada, tendo em conta que ocorreu em apenas um par de décadas.
Os cientistas da missão estão ainda a investigar a contribuição de outros mecanismos neste fenómeno, incluindo a troca de momento angular entre Vénus e a Terra quando os dois planetas se encontram mais próximos um do outro.
Podem ler mais pormenores desta curiosa descoberta aqui.

quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

Fim de tarde na cratera Endeavour

O interior da cratera Endeavour visto pelo robot Opportunity do cimo do cabo York. Mosaico em cores naturais, construído com imagens obtidas a 25 de Janeiro de 2012.
Crédito: NASA/JPL-Caltech/Cornell/Arizona State University/mosaico e composição a cores de Damien Bouic.

Este é talvez o mais belo retrato da superfície de Marte alguma vez obtido pelo robot Opportunity. Estacionado no extremo norte do cabo York, Oppy registou as imagens que compõem este magnífico mosaico pouco tempo antes da luz solar abandonar por completo a paisagem em seu redor. O pequeno explorador parece ter ainda captado inadvertidamente a sua própria sombra rodeada por uma auréola brilhante, um fenómeno óptico conhecido por efeito de oposição.
Cliquem na imagem para a ampliarem.

Hovnatanian

A cratera Hovnatanian fotografada de perto pela sonda MESSENGER a 16 de Janeiro de 2012.
Crédito: NASA/Johns Hopkins University Applied Physics Laboratory/Carnegie Institution of Washington.

Nem todos os impactos produzem crateras circulares. Impactos com ângulos de incidência inferiores a 15º geram normalmente crateras com formas elípticas, como esta cratera mercuriana recentemente fotografada pela sonda MESSENGER.
Denominada Hovnatanian (em honra a Hakop Hovnatanian, pintor arménio do século XIX), esta estrutura com 33 km de comprimento possui ainda uma outra característica típica das crateras formadas por impactos extremamente oblíquos. Nos flancos a leste e a oeste, esta cratera exibe sistemas de raios dispostos num padrão em forma de borboleta. Estes raios de ejecta são particularmente brilhantes em comparação com a superfície vizinha, o que indicia a relativa juventude em termos geológicos desta estrutura de impacto.

O sistema de raios de Hovnatanian numa imagem captada pela sonda MESSENGER a 14 de Janeiro de 2008.
Crédito: NASA/Johns Hopkins University Applied Physics Laboratory/Carnegie Institution of Washington.

segunda-feira, 6 de fevereiro de 2012

Os satélites irregulares de Júpiter

Recentemente, tomámos conhecimento da descoberta de dois novos pequenos satélites irregulares de Júpiter. Que objectos são estes e qual a sua origem?
Em Astronomia Planetária, os satélites dos planetas gigantes são agrupados de acordo com as suas características orbitais em duas grandes classes. A primeira, a classe dos satélites regulares, é formada por objectos que se movem em órbitas quase circulares, próximas do plano equatorial do planeta hospedeiro, e com períodos relativamente curtos. Por oposição, a classe dos satélites irregulares agrega objectos cujas órbitas apresentam períodos excepcionalmente longos (entre 1 a 10 anos), e frequentemente grandes inclinações e excentricidades.
Os modelos de formação das luas dos gigantes gasosos do Sistema Solar têm demonstrado origens distintas para os dois grupos. Os satélites regulares foram certamente formados in situ, via acrecção de material da nebulosa protoplanetária. Os satélites irregulares tiveram provavelmente origem em objectos capturados de órbitas heliocêntricas durante as fases derradeiras da acrecção planetária. Numa fase posterior, a maioria deverá ter sofrido fragmentações resultantes de violentas colisões, um mecanismo que explica a actual ocorrência de famílias ou grupos com características físicas e orbitais semelhantes.
As primeiras descobertas de satélites irregulares surgiram com o advento na Astronomia das placas fotográficas (nos finais do século XIX). No entanto, foi a aplicação em meados dos anos 90 da tecnologia CCD (charge-coupled devices) nas câmaras fotográficas dos grandes observatórios astronómicos, que permitiu a detecção nos últimos 15 anos de um grande número destes objectos. Neste momento estão catalogados 112 satélites irregulares no Sistema Solar (58 em Júpiter, 38 em Saturno, 9 em Urano e 7 em Neptuno).

Imagens de um novo satélite irregular joviano, o S/2011 J2, detectado através de câmaras CCD montadas no telescópio Magellan-Baade do Observatório de Las Campanas, Chile.
Crédito: Scott S. Sheppard, CIW.

A maioria dos satélites irregulares conhecidos encontram-se na órbita de Júpiter, não só por ser o gigante gasoso mais próximo da Terra e, consequentemente, onde é mais fácil encontrar objectos de brilho débil, mas também por possuir a maior esfera de Hill de todos os planetas do Sistema Solar. Em cerca de seis dezenas de satélites irregulares jovianos conhecidos, apenas 6 apresentam uma órbita prógrada (os seis mais interiores). Os restantes têm órbitas retrógradas com semi-eixos maiores que se estendem até 0,47 vezes o raio da esfera de Hill joviana (rH♃ = 0,35 UA).
Apesar de serem fortemente influenciados pela atracção gravitacional do Sol e dos outros planetas, os satélites irregulares de Júpiter mantêm-se estáveis nas respectivas órbitas devido ao mecanismo de Lidov-Kozai (uma oscilação sincrónica e periódica entre as inclinações e as excentricidades orbitais).

As órbitas dos satélites de Júpiter (visão polar). Estão representadas a roxo as órbitas das luas de Galileu. A verde está representada a órbita de Temisto, o mais interior dos satélites irregulares prógrados. As órbitas dos restantes satélites irregulares prógrados estão indicadas a azul escuro (grupo de Himalia) e a azul claro (único membro do grupo de Carpo). A vermelho encontram-se assinaladas as órbitas dos satélites irregulares retrógrados.
Crédito: Scott S. Sheppard.

Nas condições actuais é praticamente impossível a captura permanente de objectos pelo planeta Júpiter, devido à inexistência de um mecanismo eficaz de dissipação de energia orbital. A acumulação de objectos capturados na sua órbita deverá ter ocorrido com maior facilidade quando o planeta se encontrava ainda envolto pela densa nebulosa planetária, ou seja, numa escala de tempo relativamente curta. Se assim foi, a captura dos satélites irregulares jovianos foi um processo relativamente rápido, ocorrido numa altura em que o planeta se encontrava ainda em plena formação.
Uma observação cuidada dos parâmetros orbitais destes objectos revela alguns agrupamentos óbvios. Nos satélites irregulares prógrados é distinta a formação de pelo menos três grupos: o grupo de Himalia, formado por Leda, Himalia, Lisiteia, Elara e S/2000 J11; e os grupos de Temisto e Carpo, formados apenas pelas luas que lhes dão o nome. Os satélites irregulares retrógrados apresentam pelo menos 5 agrupamentos: o grupo de Ananque com 16 membros; o grupo de Carme com 17 membros; o grupo de Pasífae com 15 membros; e os grupos de S/2003 J2 e S/2003 J12, formados cada um por apenas um objecto.

Gráfico ilustrando os agrupamentos dos satélites irregulares retrógrados de Júpiter tendo em conta o semi-eixo maior e a inclinação orbital média de cada objecto. Estão representados em diferentes cores os 5 grupos: Ananque a vermelho, Carme a azul, Pasífae a verde, S/2003 J2 a castanho e S/2003 J12 a amarelo. A preto estão representados os dois objectos recentemente descobertos S/2011 J1 e S/2011 J2. O tamanho de cada circunferência é proporcional ao diâmetro do objecto (as circunferências mais pequenas representam objectos com diâmetro inferior a 3 quilómetros).
Crédito: Sérgio Paulino (dados obtidos aqui).

Gráfico ilustrando os agrupamentos dos satélites irregulares retrógrados de Júpiter tendo em conta o semi-eixo maior e a excentricidade orbital média de cada objecto. Foram seguidos os mesmos critérios de cores e tamanhos das circunferências referidos no gráfico de cima.
Crédito: Sérgio Paulino (dados obtidos aqui).

Até agora foram apenas observados em detalhe alguns dos maiores satélites irregulares de Júpiter. Todos parecem apresentar albedos muito baixos (entre 0,04 e 0,05) e cores muito semelhantes aos asteróides troianos jovianos e aos asteróides carbonáceos escuros tipo C, P e D, muito abundantes nas regiões mais exteriores da Cintura de Asteróides. Os grupos prógrados aparentam possuir uma cor mais vermelha e mais homogénea que os grupos retrógrados.
Estas características sugerem uma origem comum à dos pequenos objectos em órbitas heliocêntricas nas proximidades de Júpiter, o que reafirma a teoria da captura sugerida pelos modelos.

Himalia visto pela sonda Cassini a 19 de Dezembro de 2000, a uma distância de 4,4 milhões de quilómetros. As imagens da Cassini são as melhores alguma vez obtidas de um satélite irregular de Júpiter.
Crédito: NASA/JPL/University of Arizona.

Podem ler mais sobre estes objectos aqui, aqui e aqui.

sábado, 4 de fevereiro de 2012

Descobertas duas novas luas de Júpiter

Imagens de um novo satélite joviano, o S/2011 J2, obtidas através do telescópio Magellan-Baade do Observatório de Las Campanas, Chile.
Crédito: Scott S. Sheppard, CIW.

Foram descobertas duas novas pequenas luas na órbita do gigante gasoso Júpiter. Designados provisoriamente S/2011 J1 e S/2011 J2, os dois objectos foram observados pela primeira vez pelo astrónomo americano Scott S. Sheppard em imagens obtidas a 27 de Setembro de 2011, através do telescópio Magellan-Baade do Observatório de Las Campanas, Chile.
As duas novas luas não medem mais de 1 km de diâmetro, e ocupam órbitas retrógradas muito distantes do gigante gasoso, com períodos orbitais de 580,7 e 726,8 dias.
Com esta descoberta a contagem de luas de Júpiter ascende agora a 67! Podem ver aqui outros elementos dos parâmetros orbitais destes dois novos objectos.

sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012

Sobrevoando Adiri

Titã em duas composições a cores obtidas pela sonda Cassini a 30 de Janeiro de 2012. A primeira combina três imagens captadas através de filtros para as cores azul, verde e vermelho (respectivamente, 460 nm, 567 nm e 648 nm), e ilustra o aspecto da grande lua de Saturno, tal como seria visto por olhos humanos. A segunda composição resulta da combinação de duas imagens captadas na faixa do infravermelho próximo (890 nm e 939 nm) com uma imagem captada através de um filtro para a cor azul. A verde estão representadas áreas da superfície de Titã. As camadas mais opacas da estratosfera titaniana, onde o metano absorve a maior parte da luz solar, estão representadas a vermelho. Por fim, o azul representa as camadas mais exteriores da atmosfera.
Crédito: NASA/JPL/Space Science Institute/composições a cores de Sérgio Paulino.

A Cassini realizou esta semana um encontro com a lua Titã com o objectivo principal de inspeccionar Ontario Lacus, uma enorme massa de metano líquido situada perto do pólo sul titaniano. Durante esta passagem a uma altitude relativamente elevada (cerca de 31 mil quilómetros), a sonda obteve estes invulgares retratos da gigantesca lua de Saturno, centrados no seu hemisfério anti-saturniano.
Adiri surge proeminente na imagem da direita, ladeada pelas escuras planícies de Shangri-La e Belet. A 14 de Janeiro de 2005, a Huygens concretizava uma alunagem histórica no extremo leste desta região.

Titã em cores falsas vista pela sonda Cassini a 30 de Janeiro de 2012. Encontra-se assinalado na imagem o local de alunagem da sonda Huygens.
Crédito: NASA/JPL/Space Science Institute/composição a cores e anotações de Sérgio Paulino.

NASA divulga primeiras imagens da MoonKAM

Foram anteontem divulgadas pela NASA as primeiras imagens da superfície da Lua obtidas por uma das MoonKAM, as pequenas câmaras que equipam as duas sondas gémeas GRAIL. O registo faz parte de um teste realizado a 19 de Janeiro à MoonKAM da GRAIL-A (ou Ebb, como foi recentemente baptizada por alunos americanos), quando esta se encontrava a mais de 1.200 km de altitude.


As imagens mostram o lado mais distante da Lua, desde o pólo norte até aos terrenos acidentados das regiões mais meridionais. A estrutura geológica mais proeminente visível a leste é Mare Orientale, uma bacia de impacto com cerca de 900 km de diâmetro.
As MoonKAM atingirão o seu máximo de resolução quando as duas sondas GRAIL alcançarem em Março uma órbita quase circular, a apenas 55 km de altitude.