quarta-feira, 30 de dezembro de 2015

Polígonos numa cratera boreal

Orla de uma cratera boreal em Marte. Imagem obtida pela câmara HiRISE da sonda Mars Reconnaissance Orbiter, a 20 de setembro de 2015 (norte para a esquerda).
Crédito: NASA/JPL/University of Arizona.

As colinas visíveis nesta imagem fazem parte da orla de uma antiga cratera de impacto com cerca de 6 km de diâmetro, localizada no extremo oriental de Vastitas Borealis, na superfície de Marte. A paisagem desta região é dominada pela presença de células poligonais com alguns metros de diâmetro, delimitadas por fraturas interligadas resultantes de tensões térmicas geradas sazonalmente no solo permanentemente gelado.

Estas estruturas são comuns nas latitudes polares do planeta vermelho, mas nem sempre são tão evidentes como as que podemos apreciar na camada de sedimentos que preenche o interior da cratera. Nesta área, as fraturas encontram-se realçadas pelo branco das geadas primaveris.

A orla da cratera restringe a propagação das fraturas, pelo que aqui tendem a formar-se polígonos rectangulares de maiores dimensões com uma disposição concêntrica. No centro da cratera, os polígonos vão-se fragmentando gradualmente em padrões fractais, criando uma estrutura reticulada muito mais típica.

quinta-feira, 24 de dezembro de 2015

Sobre um horizonte lunar

A Terra vista acima da superfície da Lua, numa imagem obtida pela Lunar Reconnaissance Orbiter, a 12 de outubro de 2015.
Crédito: NASA/GSFC/Arizona State University.

Esta fabulosa composição a cores foi construída com imagens captadas pela Lunar Reconnaissance Orbiter (LRO) no passado mês de outubro e mostra o nosso planeta pairando sobre as montanhas a oeste da cratera Compton, no lado mais distante da Lua. A sequência completa revela o que aparenta ser a Terra a desaparecer gradualmente além do horizonte lunar, no entanto, este movimento não é mais do que o resultado da deslocação da sonda da NASA ao longo da sua órbita em redor da Lua.

Como o período de rotação da Lua coincide exatamente com o seu período de translação, a Terra surgiria no mesmo ponto do céu a um observador estático situado na superfície lunar, no lado da Lua mais próximo da Terra. Este fenómeno é uma consequência do efeito de maré produzido pela proximidade da Lua ao nosso planeta.

No caso da LRO a situação é diferente. Viajando dezenas de quilómetros acima da superfície lunar, a sonda da NASA passa diariamente por cerca de 12 "nasceres da Terra". Contudo, como quase sempre está ocupada a observar a superfície da Lua, são raras as oportunidades que a LRO tem para captar imagens do nosso planeta. Para o fazer, a sonda tem de rodar na direção do horizonte lunar e tombar no sentido do movimento, de forma a maximizar as dimensões do horizonte no enquadramento da câmara. Embora complicada, a manobra permite a captação de invulgares vislumbres do nosso frágil planeta pairando acima da paisagem desolada de outro corpo planetário.

Vejam a imagem de cima na sua máxima resolução aqui.

Cassini concretiza último encontro com Encélado

Encélado posando em frente a Saturno, numa imagem obtida pela sonda Cassini, a 19 de dezembro de 2015.
Crédito: NASA/JPL-Caltech/Space Science Institute.

Já chegaram à Terra as imagens captadas pela Cassini no passado fim de semana, durante o seu derradeiro encontro com Encélado. "Esta última passagem evoca-nos em simultâneo sentimentos de tristeza e de triunfo", afirmou Earl Maize, um dos responsáveis da missão. "Apesar de estarmos tristes por termos concluído os encontros a curta distância, colocámos a pedra angular numa década incrível em que investigámos um dos mais intrigantes corpos do Sistema Solar."

Os desfiladeiros de Harran Sulci vistos pela Cassini, a 19 de dezembro de 2015, a uma distância aproximada de 34 mil quilómetros.
Crédito: NASA/JPL-Caltech/Space Science Institute.

O encontro ocorreu a uma distância de 4999 km e teve como objetivo principal medir a quantidade de calor veiculada desde o interior de Encélado, através das fraturas que rasgam a crusta gelada na região do polo sul. A Cassini irá cumprir mais alguns passagens pela pequena lua saturniana, antes de concluir a sua missão em setembro de 2017, contudo estas ocorrerão a distâncias significativamente superiores.

A sonda da NASA detetou a presença de atividade geológica na superfície de Encélado pouco tempo depois da sua chegada a Saturno, em junho de 2004. A descoberta motivou uma série de mudanças no plano de voo da missão, de modo a maximizar o número de encontros com a pequena lua. Este último foi o 22º da missão.

A secção meridional de Samarkand Sulci num mosaico de 3 imagens obtidas pela Cassini a 19 de dezembro de 2015 (resolução aproximada: 74 metros/píxel).
Crédito: NASA/JPL-Caltech/Space Science Institute/Sérgio Paulino.

"Dizemos um adeus comovente às observações a curta distância deste magnífico mundo gelado", disse Linda Spilker, investigadora da missão no Laboratório de Propulsão a Jato da NASA. "A Cassini realizou um grande número de descobertas empolgantes acerca de Encélado, contudo permanecem muitas outras por fazer, [em particular as] que permitam responder àquela pergunta essencial: Será que aquele pequeno mundo oceânico alberga vida?"

Depois de desvendar a presença de atividade geológica em Encélado, a Cassini foi protagonista de uma série de surpreendentes descobertas acerca dos jatos de vapor e partículas de gelo de água que brotam da região do polo sul. Em setembro passado, após uma década de contínuas observações, os cientistas anunciaram, finalmente, a descoberta de fortes evidências da presença de um oceano global de água líquida escondido debaixo da crusta gelada de Encélado, firmando a posição deste pequeno mundo gelado na lista dos locais mais promissores no Sistema Solar para a procura de uma biosfera extraterrestre.

segunda-feira, 21 de dezembro de 2015

Começa amanhã o inverno

A Terra vista pelo satélite Deep Space Climate Observatory, a 16 de dezembro de 2015.
Crédito: NASA/NOAA.

Ocorre esta madrugada, pelas 04:48 (hora de Lisboa), o solstício de inverno - o momento exato em que se inicia o inverno no hemisfério norte. Do ponto de vista astronómico, o evento é assinalado pelo instante em que o Sol alcança a declinação mínima na esfera celeste (exatamente 23° 26′ 10″ a sul do equador).

A nova estação prolongar-se-á por 88,99 dias, até ao próximo equinócio que ocorrerá no dia 20 de março, pelas 04:30 (hora de Lisboa). A palavra Solstício tem origem latina (solstitium) e está associada à ideia de que o Sol ficaria estacionário ao atingir os pontos extremos de declinação.

sexta-feira, 18 de dezembro de 2015

Nix vista de perto

A lua Nix numa imagem obtida pela New Horizons a 14 de julho de 2015 (resolução aproximada: 0,44 km/píxel).
Crédito: NASA/JHUAPL/SwRI.

Esta imagem foi enviada esta semana pela sonda New Horizons e mostra a lua Nix vista pela câmara MVIC (Multispectral Visible Imaging Camera) a uma distância de cerca de 22,2 mil quilómetros. Captada com um ângulo de iluminação de aproximadamente 90º, a imagem revela novos detalhes acerca do registo de impactos preservado na superfície desta pequena lua de Plutão.

sexta-feira, 11 de dezembro de 2015

Sucesso! Akatsuki está na órbita de Vénus!

O planeta Vénus visto pela sonda Akatsuki. Imagem obtida pela câmara de ultravioletas (UVI), no dia 07 de dezembro de 2015, a uma altitude de 72 mil quilómetros.
Crédito: JAXA.

A Akatsuki completou com sucesso a sua segunda tentativa para alcançar uma órbita em redor de Vénus, confirmou anteontem a JAXA num comunicado de imprensa. A sonda japonesa encontra-se agora a viajar numa órbita elíptica com uma apoápside de 440 mil quilómetros, uma periápside de cerca de 400 quilómetros, uma inclinação de 3º e um período orbital de 13 dias e 14 horas.

Nos próximos 3 meses, a Akatsuki irá completar o comissionamento dos seus 6 instrumentos científicos, incluindo as três câmaras já testadas na passada segunda-feira. Ao mesmo tempo, a sonda irá ajustar gradualmente a sua trajetória para uma órbita mais curta, com um período de cerca de 9 dias e uma inclinação de 25º. Se tudo correr bem, as observações científicas deverão arrancar no próximo mês de abril.

quarta-feira, 9 de dezembro de 2015

Encontros com as luas dos anéis

Este fim de semana, a Cassini realizou uma sequência de encontros relativamente próximos com três das pequenas luas que orbitam nas proximidades do limite exterior do sistema principal dos anéis de Saturno. Esta foi uma oportunidade para a sonda da NASA captar algumas das melhores imagens destes pequenos objetos.

No primeiro encontro, a Cassini sobrevoou Epimeteu a uma altitude de apenas 2616 km. A passagem permitiu a obtenção de dois conjunto de imagens a distâncias entre os 26 e os 36 mil quilómetros, e o mapeamento das temperaturas e composição da superfície recorrendo ao instrumento CIRS (Composite Infrared Spectrometer).

A lua Epimeteu vista pela sonda Cassini, a 06 de dezembro de 2015, a uma distância de 35 mil quilómetros (resolução da imagem: 212 metros/píxel). No hemisfério sul é possível observar as crateras Pollux e Hilairea.
Crédito: NASA/JPL-Caltech/SSI.

Uma segunda imagem de Epimeteu, obtida pela Cassini poucos minutos depois, a uma distância de 26,6 mil quilómetros.
Crédito: NASA/JPL-Caltech/SSI.

Depois do encontro com Epimeteu, a Cassini concretizou mais dois encontros, primeiro com a lua Atlas, a uma distância de 20857 km, e depois com Prometeu, a uma distância de 20985 km. Durante o encontro com a Atlas, a sonda da NASA obteve as melhores imagens de sempre da pequena lua.

Atlas vista pela sonda Cassini, a 06 de dezembro de 2015, a uma distância aproximada de 32 mil quilómetros (resolução da imagem: 190 metros/píxel). A pequena lua orbita Saturno no interior da divisão de Roche, entre os anéis A e F. Na imagem podemos ver o limite exterior do anel A.
Crédito: NASA/JPL-Caltech/SSI.

Prometeu em cores naturais. Composição construída com imagens obtidas pela Cassini a 06 de dezembro de 2015, a uma distância aproximada de 37 mil quilómetros (resolução da imagem: 220 metros/píxel). Prometeu orbita Saturno junto ao limite interior do anel F (visível na parte superior da imagem).
Crédito: NASA/JPL-Caltech/SSI/Sérgio Paulino.

Dentro de duas semanas, a Cassini fará uma nova passagem por uma das pequenas luas dos anéis. No dia 19 de dezembro, a sonda da NASA sobrevoará a superfície de Egéon, a uma distância de apenas 2518 km. Egéon é a mais pequena das luas conhecidas do Sistema Solar e uma das mais alongadas. É também o local de origem dos materiais que constituem o anel G, um dos anéis menos brilhantes de Saturno.

domingo, 6 de dezembro de 2015

New Horizons envia as imagens mais detalhadas da superfície de Plutão

Na semana passada, a New Horizons enviou um novo conjunto de imagens fenomenais de Plutão, captadas durante o seu encontro com o planeta anão no passado mês de julho. As novas imagens fazem parte de uma sequência captada cerca de 15 minutos antes da sua maior aproximação à superfície plutoniana e revelam detalhes sem precedentes de uma grande variedade de terrenos, incluindo crateras, montanhas e planícies glaciares. A resolução varia entre os 77 e os 85 metros por píxel, o que permite identificar estruturas com uma dimensão equivalente a um quarteirão citadino.

A superfície de Plutão num mosaico de 19 imagens obtidas pela câmara LORRI (Long Range Reconnaissance Imager) da sonda New Horizons, a 14 de julho de 2015, a uma distância aproximada de 17 mil quilómetros.
Crédito: NASA/Johns Hopkins University Applied Physics Laboratory/Southwest Research Institute/Sérgio Paulino.

O mosaico de cima foi construído com uma fração das imagens disponibilizadas anteontem pela NASA e mostra uma faixa de terreno com cerca de 80 quilómetros de diâmetro, que se estende desde o horizonte recortado de Plutão, a norte da cratera Burney, até ao coração de Sputnik Planum. Pelo meio podemos apreciar um conjunto de maciços montanhosos conhecidos informalmente por al-Isidri Montes.

"As montanhas que limitam Sputnik Planum são verdadeiramente fenomenais nesta resolução", afirmou John Spencer, membro da equipa científica da missão New Horizons. "Os novos detalhes agora revelados, em particular as cristas enrugadas nos terrenos pedregosos que rodeiam muitas das montanhas, reforça a nossa primeira impressão de que estas montanhas são blocos de gelo enormes que foram empurrados e tombados, e que de alguma forma foram transportados até aos locais onde hoje se encontram."

Estas novas imagens têm uma resolução 5 vezes superior à das melhores imagens de Tritão, a lua de Neptuno "prima" de Plutão, captadas pela sonda Voyager 2 em 1989, e constituem os retratos mais detalhados da superfície de um objeto de grandes dimensões da Cintura de Kuiper, que iremos ter disponíveis nas próximas décadas. A New Horizons encontra-se agora a cerca de 173 milhões de quilómetros de distância de Plutão e a aproximadamente 5,23 mil milhões de quilómetros da Terra. Os sinais de rádio da sonda levam agora cerca de 4 horas e 50 minutos a alcançar o nosso planeta.

sábado, 5 de dezembro de 2015

New Horizons observa um plutino

1994 JR1 numa sequência de 4 imagens obtidas pela câmara LORRI da sonda New Horizons, a 02 de novembro de 2015. 1994 JR1 tem aproximadamente 127 km de diâmetro e, na altura, encontrava-se a cerca de 3,3 mil milhões de quilómetros de distância do Sol.
Crédito: NASA/JHUAPL/SwRI.

No passado mês de novembro, a New Horizons captou imagens de um objeto distante da Cintura de Kuiper, demonstrando assim a sua capacidade para observar numerosos destes corpos durante os próximos 3 anos, caso a NASA aprove uma extensão à missão original, que incluirá o encontro em 2019 com 2014 MU69, um membro da população "fria" da Cintura de Kuiper.

O objeto agora observado denomina-se (15810) 1994 JR1 e é um plutino com um comportamento dinâmico bastante peculiar. Simulações da sua trajetória orbital sugerem que este objeto é um quase-satélite de Plutão, o primeiro e único conhecido numa órbita transneptuniana. Esta relação parece manter-se há quase 100 mil anos e deverá ser interrompida dentro de 250 mil anos, quando 1994 JR1 alcançar o ponto langragiano L5 do sistema Sol-Plutão.

As imagens da New Horizons foram captadas a uma distância de 280 milhões de quilómetros e mostram 1994 JR1 movendo-se sobre um fundo de estrelas brilhantes. Os responsáveis da missão pretendem usar estas observações para conhecerem melhor as características orbitais destes objetos.

domingo, 29 de novembro de 2015

Uma segunda oportunidade para a missão Akatsuki

Representação artística mostrando a sonda Akatsuki a sobrevoar o planeta Vénus.
Crédito: JAXA/Akihiro Ikeshita.

No próximo dia 7 de dezembro, a Akatsuki terá uma segunda oportunidade para alcançar o planeta Vénus. Há cerca de 5 anos, a sonda japonesa viu-se condenada a vaguear numa órbita heliocêntrica, depois de uma avaria catastrófica no sistema de propulsão ter abortado a sua primeira tentativa de inserção orbital.

De acordo com os responsáveis da missão, a Akatsuki concluiu com sucesso as suas últimas manobras de correção de trajetória, pelo que deverá passar por Vénus a uma altitude mínima de 541 km. Durante o encontro, a sonda japonesa irá executar uma queima de combustível durante 20 minutos e 33 segundos, usando 4 dos seus 8 propulsores de controlo de atitude. Esta manobra deverá ser suficiente para colocar a Akatsuki numa órbita alongada em redor de Vénus com um período de 15 dias.

Os propulsores de controlo de altitude foram concebidos para controlarem a altitude orbital, pelo que uma queima tão prolongada poderá implicar alguns riscos. Testes realizados recentemente demonstraram, no entanto, que o propulsores funcionam na perfeição pelo menos durante 10 minutos, o que deixa os responsáveis da missão confiantes no sucesso da manobra.

Originalmente, a Akatsuki deveria alcançar uma órbita com um período de 30 horas, e com uma periápside de 300 km e uma apoápside de 7900 km. Esta órbita tinha sido escolhida com o propósito de sincronizar o movimento orbital da sonda japonesa com o fluxo dos ventos nas camadas superiores da atmosfera venusiana durante um período aproximado de 20 horas.

A nova órbita terá uma forma diferente. Depois de estabelecida uma trajetória com um período orbital de 15 dias, a Akatsuki deverá realizar uma segunda queima de combustível no próximo mês de março para encurtar o seu período orbital para 9 dias. A órbita resultante ficará com uma apoápside de 400 mil quilómetros, o que ainda assim deverá ser suficiente para cumprir a maioria dos objetivos iniciais da missão.

sábado, 28 de novembro de 2015

Verão no hemisfério sul do cometa 67P/Churyumov-Gerasimenko

O cometa 67P/Churyumov-Gerasimenko visto pela sonda Rosetta, a 22 de novembro de 2015.
Crédito: ESA/Rosetta/NavCam.

A imagem de cima mostra grande parte do hemisfério sul do núcleo do cometa 67P/Churyumov-Gerasimenko, incluindo três regiões que até há poucos meses permaneciam completamente escondidas na sombra. No lobo mais pequeno é possível identificar a região relativamente plana de Wosret, enquanto que no pescoço e no lobo maior se destacam os terrenos acidentados de Sobek e Anhur.

O cometa 67P tem um eixo de rotação com uma inclinação de cerca de 52º, o que em conjunto com a sua forma complexa e a sua órbita extremamente elíptica cria uma distribuição muito desigual das estações nos dois hemisférios. No passado mês de maio, o hemisfério sul emergiu de um longo inverno de 5,6 anos, iniciando um curto mas intenso verão de aproximadamente 10 meses.

sábado, 21 de novembro de 2015

Os polos de Ceres

Os polos de Ceres vistos pela sonda Dawn.
Crédito: NASA/JPL-Caltech/UCLA/MPS/DLR/IDA.

A equipa da missão Dawn divulgou ontem os primeiros retratos completos das regiões polares de Ceres. Os retratos foram construídos com imagens captadas pela sonda da NASA entre 17 de agosto e 23 de outubro de 2015, a uma altitude de 1470 km, e incluem toda a superfície do planeta anão acima dos 65º de latitude.

Na imagem de cima, a área em redor do polo sul aparece tingida de negro porque se manteve escondida nas sombras desde a chegada da Dawn a Ceres, a 6 de março de 2015. Ainda assim é possível contemplar uma parte significativa dos territórios imediatamente a norte desta pequena área, incluindo os terrenos acidentados que ladeiam as crateras Zanedi e Attis. Na região do polo norte são visíveis as crateras Jarovit, Ghanan e Asari, bem como Ysolo Mons, uma montanha com cerca de 17 km de diâmetro, que se eleva a curta distância do polo norte.

Os investigadores usam estes mapas para estudarem a morfologia das crateras polares e compará-la com a das crateras que cobrem outras partes da superfície de Ceres. As variações na forma e complexidade destas estruturas podem indicar diferentes composições nas camadas superficiais destas regiões. Por outro lado, algumas áreas no interior destas crateras ficam permanentemente escondidas nas sombras, pelo que os cientistas querem investigar a possibilidade destas regiões poderem albergar quantidades significativas de gelo de água.

quarta-feira, 18 de novembro de 2015

Astrónomos testemunham colisão entre objetos da Cintura de Asteroides

Imagens obtidas pelo telescópio Subaru a 17 de março de 2015, mostrando o asteroide 493 Griseldis. Nos primeiros 3 painéis podemos ver o asteroide movendo-se da esquerda para a direita. O 4º painel resulta da combinação das 3 primeiras imagens, depois de suprimido o brilho da galáxia que interfere com a cauda do asteroide na primeira imagem.
Crédito: David Tholen, Scott Sheppard e Chad Trujillo.

Astrónomos testemunharam o que aparenta ter sido uma colisão entre objetos da Cintura de Asteroides. Imagens captadas no passado dia 17 de março, pelo telescópio Subaru de 8,2 metros, em Mauna Kea, no Hawai'i, mostram uma pequena cauda partindo do asteroide 493 Griseldis, um objeto rochoso do tipo espetral P com cerca de 46 km de diâmetro e um período orbital de 5,5 anos. Esta estrutura não é visível em imagens de arquivo captadas em 2010 e 2012 e manteve-se aparentemente ativa apenas durante um período muito curto.

Contrariamente às caudas dos cometas, que se estendem na direção oposta à do Sol devido à ação do vento solar e da pressão da radiação solar, a cauda de Griseldis não apontava numa direção antisolar. Observações adicionais realizadas 4 noites depois, através do telescópio Magellan de 6,5 metros, no Chile, confirmaram a presença de uma estrutura débil pairando sobre o asteroide, embora com uma intensidade claramente mais fraca. Contudo, imagens subsequentes, captadas a 24 de março, revelaram que a cauda tinha desaparecido completamente, não voltando a ser vista posteriormente, a 18 de abril e a 21 de maio. Como o fenómeno foi transitório, os investigadores concluíram que as observações são consistentes com a ocorrência de um impacto na superfície de Griseldis.

A Cintura de Asteroide contém pouco mais de 200 objetos com diâmetros superiores a 100 km, no entanto, os cientistas estimam que possam existir nesta região entre 750 mil a quase 2 milhões de asteroides com mais de 1 km de diâmetro. Apesar dos números, a distância média entre estes objetos é 10 vezes superior à distância que separa a Lua da Terra, pelo que estes fenómenos são relativamente raros.

sábado, 14 de novembro de 2015

Rosetta deteta oxigénio molecular no cometa 67P/Churyumov–Gerasimenko

O cometa 67P/Churyumov–Gerasimenko visto pela câmara de navegação da sonda Rosetta a 16 de agosto de 2015.
Crédito: ESA/Rosetta/NavCam.

Dados obtidos pelo espetrómetro de massa ROSINA-DFMS da sonda Rosetta revelaram a presença de oxigénio molecular (O2) na cabeleira do cometa 67P/Churyumov–Gerasimenko. A descoberta foi divulgada num artigo recentemente publicado na revista Nature, e sugere que o núcleo do cometa terá incorporado as moléculas de O2 durante a sua formação, há aproximadamente 4,5 mil milhões de anos.

Desde há mais de 1 ano que a Rosetta analisa repetidamente a composição química da atmosfera rarefeita que envolve o núcleo de 67P/Churyumov–Gerasimenko. Até agora, o vapor de água (H2O), o monóxido de carbono (CO) e o dióxido de carbono (CO2) revelaram ser as moléculas mais abundantes na cabeleira do cometa, contudo, a sonda europeia já detetou uma grande variedade de outras espécies moleculares ricas em carbono, azoto e enxofre, incluindo o amoníaco (NH3), o metano (CH4), o metanol (CH3OH), o formaldeído (CH2O), o ácido sulfídrico (H2S), o ácido cianídrico (HCN), dióxido de enxofre (SO2) e dissulfureto de carbono (CS2).

O oxigénio é o terceiro elemento mais abundante no Universo, mas a sua versão molecular mais simples, o O2, é particularmente difícil de detetar por ser extremamente reativo. “Não estávamos à espera de detetar O2 no cometa – em particular em tamanha abundância – porque é quimicamente muito reativo, pelo que foi uma grande surpresa,” disse Kathrin Altwegg, investigadora da Universidade de Berna, na Suiça e uma das coautoras deste trabalho. "Foi também inesperado porque não há muitos exemplos de deteção de O2 interestelar, pelo que, apesar destas moléculas terem sido muito provavelmente incorporadas no cometa durante a sua formação, este resultado não é fácil de explicar à luz dos atuais modelos de formação do Sistema Solar."

Para identificar o O2, a equipa analisou mais de 3000 espetros de massa obtidos em redor do cometa, entre setembro de 2014 e março de 2015. Os resultados revelaram uma abundância relativa à água de 1 a 10%, com um valor médio de 3,80 ± 0,85% - uma ordem de magnitude mais elevada que o previsto pelos modelos que descrevem a química das nuvens moleculares a partir das quais emergem as estrelas e os sistemas planetários.

A quantidade de O2 detetada exibiu uma forte correlação com a quantidade de H2O medida em diferentes períodos, o que sugere que estas duas espécies possuem origens e mecanismos de libertação no núcleo muito similares. Esta relação manteve-se constante, mesmo com a crescente proximidade do cometa ao Sol, e não se alterou de forma significativa com a posição latitudinal e longitudinal da Rosetta nas sucessivas órbitas realizadas durante os 6 meses do estudo. Em contraste, os investigadores não observaram uma correlação significativa com o CO e o azoto molecular (N2), dois compostos com uma volatilidade semelhante ao O2, nem detetaram a presença de moléculas de ozono (O3), outro dos 4 alótropos do oxigénio.

Correlação entre a abundância de O2 e H2O medidas pela Rosetta no período entre setembro de 2014 e março de 2015.
Crédito: A. Bieler et al. (2015).

A equipa explorou várias cenários que pudessem explicar a presença e abundância de O2, bem como a sua relação com a água e a ausência de O3 em todos os espetros analisados. Num dos cenários, os investigadores consideraram a possibilidade do O2 poder ter sido produzido ao longo do tempo no núcleo do cometa por fotólise e radiólise das moléculas de H2O.

Na fotólise, os fotões quebram as ligações entre os átomos constituintes das moléculas, enquanto que a radiólise envolve a presença de fotões mais energéticos ou eletrões e iões velozes depositando energia na superfície gelada do núcleo cometário e ionizando as moléculas presentes nas camadas mais superficiais - um processo observado nas luas geladas dos gigantes gasosos do Sistema Solar e nos anéis de Saturno. Ambos os processos poderiam, em princípio, conduzir à formação e libertação de moléculas de O2, no entanto, teriam de atuar ao longo dos milhares de milhões de anos em que o cometa residiu na distante Cintura de Kuiper, e assegurariam a acumulação de O2 apenas até uma profundidade de alguns metros. Estas camadas superficiais foram já certamente removidas, desde que o cometa se fixou na sua atual órbita no interior do Sistema Solar, pelo que este mecanismo não explica as quantidades de O2 observadas.

Noutro cenário, o O2 teria sido primeiro incorporado no gelo de água formado na fase da nubelosa protossolar do nosso Sistema Solar. Os modelos que explicam a formação dos discos protoplanetários prevêem que grandes quantidades de O2 pudessem estar disponíveis na zona de formação de cometas, contudo seria necessário que as temperaturas descessem rapidamente desde valores acima dos – 173 ºC para menos de – 243 ºC para que se formassem partículas de gelo de água com moléculas de O2 presas no seu interior na superfície de grãos de poeira. Estes grãos teriam de ser posteriormente incorporados no cometa sem que a sua composição fosse alterada.

"Outra das possibilidades seria a do Sistema Solar ter sido formado numa parte invulgarmente quente de uma densa nuvem molecular, a temperaturas 10 a 20 ºC acima dos típicos – 263 ºC esperados para este tipo de nuvens”, disse Ewine van Dishoeck, investigador do Observatório de Leiden, na Holanda, e um dos coautores deste trabalho. "Isto continua a ser consistente com as estimativas para as condições de formação do cometa na nebulosa solar exterior, e ainda com anteriores descobertas realizadas no cometa, referentes à baixa quantidade de N2."

Em alternativa poderá ter ocorrido radiólise em grãos de poeira ricos em gelo de água do disco protoplanetário, antes da acreção do cometa num corpo de maiores dimensões. Neste caso, o O2 permaneceria preso nos espaços livres de gelo nos grãos de poeira, enquanto o hidrogénio se escaparia para o espaço, impedindo assim a formação de novas moléculas de H2O, o que resultaria num aumento gradual do nível de O2 no interior do gelo sólido. A incorporação destes grãos de poeira gelados no núcleo do cometa poderia explicar a forte relação com a água observada pela Rosetta.

"Independentemente da forma como foi criado, o O2 foi também, de alguma forma, protegido durante a fase de acreção do cometa", explicou Altwegg. "Isto deverá ter acontecido de forma muito mais gentil para evitar que o O2 fosse destruído por reações químicas subsequentes." De acordo com os atuais modelos de formação do Sistema Solar, a fase de acreção foi um período particularmente violento, pelo que estes resultados desafiam as atuais conceções acerca da formação e evolução dos planetas.

Podem ler mais sobre estes trabalho aqui.

quarta-feira, 11 de novembro de 2015

Criovulcões em Plutão?

Wright Mons visto pela sonda New Horizons, a 14 de julho de 2015.
Crédito: NASA/Johns Hopkins University Applied Physics Laboratory/Southwest Research Institute.

Cientistas da missão New Horizons anunciaram anteontem a descoberta do que poderão ser os primeiros exemplos de criovulcões na superfície de Plutão. As duas estruturas, conhecidas informalmente por Wright Mons e Piccard Mons, foram identificadas na região a sul de Sputnik Planum, nos terrenos adjacentes a Norgay Montes, e possuem características morfológicas semelhantes às dos vulcões em escudo observados na Terra e em Marte.

Wright Mons tem 160 km de diâmetro e uma altitude aproximada de 4 km, e exibe no seu centro o que parece ser uma grande caldeira com 56 km de diâmetro. Piccard Mons eleva-se a 5,5 km da superfície e ocupa uma área aproximada de 44 mil km2 (o equivalente a quase metade da área do território português).

Mapa topográfico dos dois possíveis criovulcões identificados em Plutão. Azul e vermelho representam terrenos respetivamente com menor e maior elevação, enquanto que o verde representa terrenos com elevação intermédia.
Crédito: NASA/Johns Hopkins University Applied Physics Laboratory/Southwest Research Institute.

"Estas [estruturas] são grandes montanhas com um enorme buraco no seu topo e, na Terra, isso significa geralmente uma coisa - um vulcão", explicou Oliver White, membro da equipa da missão New Horizons. "Se forem vulcões, então a depressão no topo terá sido provavelmente formada via colapso, através da erupção de materiais [provenientes] das camadas mais profundas. As estranhas texturas em montículos visíveis nos flancos poderão representar fluxos vulcânicos de algum tipo, que viajaram desde a região do cume até às planícies em redor. No entanto, ainda não sabemos porque têm essa morfologia ou quais os materiais que as compõem."

Durante a passagem da New Horizons, as duas montanhas encontravam-se localizadas junto à linha do terminador, o que poderá dificultar a determinação da sua composição apenas com base nos dados até agora disponíveis. Uma possibilidade sugerida por White é a de que estas estruturas poderão ter sido formadas por erupções de gelo de azoto provenientes do interior relativamente quente de Plutão. A energia necessária para derreter e mobilizar estes materiais até à superfície seria consideravelmente pequena, pelo que esta é uma possibilidade bastante razoável. É possível que a resposta a esta questão esteja ainda armazenada nos dois discos rígidos da New Horizons.

domingo, 1 de novembro de 2015

A face de um cometa morto

2015 TB145 numa imagem de radar obtida pelo radiotelescópio de Arecibo, a 30 de outubro de 2015 (resolução: 7,5 metros por píxel).
Crédito: NAIC-Arecibo/NSF.

O asteroide que ontem passou nas proximidades da Terra poderá ser na verdade um cometa extinto. Oficialmente conhecido por 2015 TB145, este estranho objeto foi descoberto no passado dia 10 de outubro, pelo projeto Pan-STARRS, e sobrevoou o nosso planeta ontem, pelas 17:01 (hora de Lisboa), a uma distância segura de 486,8 mil quilómetros (aproximadamente 1,27 vezes a distância média que separa a Lua da Terra). Com centenas de metros de diâmetro, 2015 TB145 é considerado um objeto potencialmente perigoso, pelo que os cientistas aproveitaram este evento para estudarem em detalhe as suas características físicas.

Usando uma combinação de observações realizadas através do telescópio de infravermelhos do observatório de Mauna Kea (o IRTF), no Hawai'i, e do radiotelescópio de Arecibo, em Porto Rico, investigadores da NASA descobriram que 2015 TB145 é muito provavelmente um núcleo cometário que se despojou dos seus compostos voláteis após numerosas passagens nas proximidades do Sol. Esta conclusão é consistente com a extrema excentricidade (0,86) e elevada inclinação (39,7º) da sua órbita, que sugerem que este objeto é um antigo cometa da família de Júpiter.

"Descobrimos que este objeto reflete cerca de 6% da luz que recebe do Sol", explicou Vishnu Reddy, investigador do Instituto de Ciências Planetárias, em Tucson, Arizona, nos Estados Unidos, e o responsável pelas observações realizadas em Mauna Kea, no Hawai'i. "Este valor é semelhante ao do asfalto fresco, e embora aqui na Terra consideremos que é [um material] muito escuro, este objeto é ainda assim mais brilhante que um cometa típico, que reflete apenas 3 a 5% da luz. Isto sugere que poderá ter uma origem cometária - mas como não existe uma cabeleira evidente, a conclusão é a de que é um cometa morto."

O objeto 2015 TB145 numa sequência de 7 imagens de radar obtida pelo radiotelescópio de Arecibo, a 30 de outubro de 2015 (resolução: 7,5 metros por píxel).
Crédito: NAIC-Arecibo/NSF.

As primeiras imagens de radar captadas anteontem em Arecibo tinham já demonstrado que 2015 TB145 é um objeto arredondado com um período de rotação de cerca de 5 horas e um diâmetro aproximado de 600 metros. Estas dimensões são consideravelmente superiores às estimativas iniciais (300 a 400 metros), o que sugeria que 2015 TB145 era muito mais escuro que os típicos asteroides com órbitas próximas da órbita da Terra.

As imagens revelaram ainda que este objeto tem uma aparência muito adequada para o dia das bruxas. Duas formações circulares com baixa refletividade ao radar dão a 2015 TB145 um aspecto muito semelhante ao de uma caveira humana. Estas estruturas são muito provavelmente duas grandes crateras formadas por antigos impactos ou pela volatização de gelos na superfície do cometa. "Os dados do IRTF podem indicar que este objeto poderá ser um cometa extinto, mas nas imagens de Arecibo parece que se mascarou com um traje de uma caveira para a sua passagem [pela Terra] na noite das bruxas", disse Kelly Fast, cientista do programa IRTF e um dos responsáveis pelo programa de observações de objectos com órbitas próximas da órbita da Terra da NASA.

A influência gravitacional de 2015 TB145 é ínfima quando comparada com a da Terra, pelo que o encontro de ontem não teve qualquer efeito mensurável na Lua ou no nosso planeta. A aproximação à Terra produziu, no entanto, uma ligeira alteração na trajetória deste pequeno objeto - o suficiente para aumentar um pouco as incertezas nos seus parâmetros orbitais. Seja como for, as observações até agora realizadas permitem excluir qualquer risco de impacto com o nosso planeta para pelo menos os próximos dois séculos.

sábado, 31 de outubro de 2015

Plutão em contraluz

Plutão visto pela câmara Ralph/Multispectral Visual Imaging Camera (MVIC) da sonda New Horizons a 14 de julho de 2015.
Crédito: NASA/Johns Hopkins University Applied Physics Laboratory/Southwest Research Institute.

Este mosaico foi construído com imagens captadas no passado dia 14 de julho, cerca de 15 minutos após a maior aproximação da sonda New Horizons à superfície de Plutão, e mostra um extenso panorama sobre o lado noturno do planeta anão.

No lado direito da imagem podemos ver um fino crescente com os limites meridionais da planície gelada informalmente conhecida por Sputnik Planum. Esta estrutura é flanqueada a leste (para baixo, na imagem) pelos terrenos rugosos de Krun Macula, e a oeste (para cima) pelas cadeias de montanhas de Norgay e Hillary Montes.

A geometria de iluminação torna ainda evidentes mais de uma dúzia de camadas de neblina dispondo-se verticalmente na ténue atmosfera de azoto de Plutão. Estas estruturas rodeiam a silhueta de Plutão e revelam os contornos de planaltos irregulares no lado oposto da imagem.

Podem ver esta imagem na sua máxima resolução aqui.

sexta-feira, 23 de outubro de 2015

New Horizons completa o seu primeiro retrato de família das pequenas luas de Plutão

A lua Cérbero vista pela sonda New Horizons. Esta imagem foi criada pela combinação de 4 imagens distintas obtidas pelo instrumento Long Range Reconnaissance Imager (LORRI) a 14 de julho de 2015, quando a sonda da NASA se encontrava a cerca de 396 mil quilómetro de distância da pequena lua.
Crédito: NASA/Johns Hopkins University Applied Physics Laboratory/Southwest Research Institute.

Cérbero pregou uma partida aos cientistas. Imagens enviadas esta semana pela sonda New Horizons mostram que a pequena lua de Plutão é consideravelmente mais pequena do que se pensava. "Mais uma vez fomos surpreendidos pelo sistema de Plutão", disse Hal Weaver, investigador do Laboratório de Física Aplicada da Universidade Johns Hopkins, nos Estados Unidos, e membro da equipa científica da missão.

Observações realizadas através do telescópio espacial Hubble sugeriam que a influência gravitacional de Cérbero nas restantes pequenas luas do sistema era surpreendentemente elevada. Estes resultados levaram os cientistas a considerar a hipótese de Cérbero poder ser uma lua relativamente grande e massiva, parecendo pouco brilhante apenas porque a sua superfície se encontrava coberta por materiais tão escuros como o carvão.

As luas de Plutão vistas à mesma escala.
Crédito: NASA/Johns Hopkins University Applied Physics Laboratory/Southwest Research Institute/adaptação de Sérgio Paulino.

As imagens que agora nos chegam revelam, no entanto, um cenário bem diferente. Aparentemente, Cérbero tem uma forma bilobada, com aproximadamente 12 km de comprimento e 5 km de largura, e reflete cerca de 50% da luz incidente (um valor semelhante ao das outras pequenas luas), o que sugere que a sua superfície é composta por gelo de água relativamente puro. "As nossas previsões foram quase certeiras para as outras pequenas luas, mas não para Cérbero", afirmou Mark Showalter, investigador do Instituto SETI, nos Estados Unidos, e membro da equipa científica da missão New Horizons.

Com estas novas imagens de Cérbero fica completo o primeiro retrato de família das pequenas luas de Plutão. Os cientistas esperam agora poder usar estes resultados para compreenderem melhor como evoluiu este fascinante sistema de pequenos satélites, e como se relacionam com o gigantesco impacto que deu origem à lua Caronte.

quarta-feira, 21 de outubro de 2015

Rios marcianos arrastaram seixos por dezenas de quilómetros

Seixos rolados num antigo leito fluvial, no interior da cratera Gale.
Crédito: NASA/JPL-Caltech/MSSS.

Marte é hoje um planeta frio e árido, mas há 3 mil milhões de anos a situação era muito diferente. Depósitos de seixos rolados descobertos pelo Curiosity em 2012 sugerem que no passado a água fluiu abundantemente na superfície marciana, criando redes hidrográficas relativamente estáveis. Um novo estudo publicado na semana passada na revista Nature Communications vem agora revelar evidências concretas de que os seixos observados pelo robot da NASA foram arrastados por um sistema fluvial ao longo de cerca de 50 km! Os resultados baseiam-se numa combinação de modelos teóricos e experiências laboratoriais desenhados para demonstrar como a forma destes pequenos fragmentos de rocha pode ser usada para reconstruir com precisão o seu transporte ao longo do leito de um rio.

"Há milhares de anos, Aristóteles ponderou sobre a questão dos seixos na praia e de como eles se tornam arredondados", disse Douglas Jerolmack, um geofísico da Universidade da Pennsylvania, nos Estados Unidos, e um dos coautores deste trabalho. "Contudo, até recentemente, as descrições da forma dos seixos foram sempre qualitativas e faltava-nos uma compreensão básica do processo de arredondamento."

Para enfrentar este problema, Jerolmack recrutou Gábor Domokos, um matemático da Universidade de Tecnologia e Economia de Budapeste, na Hungria, responsável pela descoberta do Gömböc, um objeto tridimensional invulgar com apenas 2 pontos de equilíbrio estático (um estável e outro instável). O Gömböc comporta-se de forma muito semelhante a um boneco sempre-em-pé, retornando sozinho ao seu ponto de equilíbrio estável independentemente da forma como é posicionado numa superfície horizontal. No entanto, ao contrário do boneco sempre-em-pé, a estrutura interna do Gömböc é homogénea, o que faz com que as suas propriedades mecânicas sejam determinadas apenas pela sua forma.

Tendo em conta que a abrasão tende a diminuir o número de pontos de equilíbrio estático das rochas, o Gömböc representa teoricamente o auge desse processo e ilustra como a forma per se pode armazenar informações vitais acerca da história natural de um objeto. Com base nesta premissa, Domokos cedo percebeu que poderia adaptar a conjetura de Poincaré (um famoso problema de matemática apenas recentemente resolvido) para descrever a evolução da geometria de estruturas tridimensionais, quando estas são submetidas a desgaste mecânico.

"A forma de um objeto pode, só por si, dizer-nos muita coisa", explicou Domokos. "Se formos a uma praia, vamos encontrar a história natural escrita debaixo dos nossos pés. Começámos a perceber que existe um código que podemos ler para compreendermos essa história."

A evolução dos contornos exteriores de um seixo rolado é orquestrada pela ação abrasiva produzida pelas colisões com outras rochas do leito fluvial, pelo que a história do seu percurso ao longo do rio está, de certa forma, inscrita na perda de massa resultante desse processo. Como não estão disponíveis dados relativos à massa dos seixos marcianos, Domokos desenvolveu um novo modelo matemático para determinar a perda de massa dos fragmentos de rocha observados pelo Curiosity usando apenas a sua forma. O seu trabalho demonstrou que, quando duas partículas de tamanho semelhante colidem entre si, a forma como influenciam a estrutura tridimensional uma da outra pode ser reduzida a um problema puramente geométrico, independentemente dos materiais que as constituem ou do ambiente onde se movem.

Modelo tridimensional da cratera Gale. Está assinalado a verde o local onde o Curiosity poisou.
Crédito: NASA/JPL-Caltech/ESA/DLR/FU Berlin/MSSS.

Com o objetivo de testar o modelo de Domokos, os investigadores realizaram uma série de experiências laboratoriais desenhadas para simular a abrasão natural de pequenos fragmentos rochosos. Recorrendo a um pequeno tambor em rotação, a equipa avaliou a evolução da forma e a perda de massa de cerca de 80 fragmentos de calcário com 15 a 35 mm de diâmetro. Os resultados mostram que a alteração da forma das rochas segue um padrão muito próximo do previsto pelo modelo matemático.

Em seguida, os investigadores compararam os resultados das experiências laboratoriais com dados recolhidos num rio de montanha, em Porto Rico. "Começámos na nascente, onde pedaços de rochas angulares se soltam das paredes do riacho e são arrastados para jusante", disse Jerolmack. "Apanhámos milhares de seixos a cada poucas centenas de metros, captámos imagens das suas silhuetas e registámos o seu peso." Os dados confirmaram, mais uma vez, que a relação entre a evolução da forma e a perda de massa é concordante com o previsto pelo modelo de Domokos.

Para explorar as consequências desta relação num ambiente comparável ao dos depósitos marcianos, os investigadores executaram a mesma análise a um conjunto de seixos rolados provenientes de um leque aluvial localizado a jusante de um desfiladeiro numa zona árida do Novo México, nos Estados Unidos. Os resultados demonstram que a distância percorrida por um seixo desde a sua origem a montante pode, de facto, ser inferida usando apenas a silhueta do seixo.

Com esta informação nas mãos, Jerolmack e os seus colegas voltaram-se para o caso particular de Marte. Usando imagens captadas pelo Curiosity, a equipa traçou os contornos de mais de 500 seixos exumados em dois afloramentos rochosos distintos localizados nas proximidades do leque aluvial que parte de Peace Vallis, um antigo desfiladeiro talhado nas montanhas da orla setentrional da cratera Gale. Aplicando o modelo matemático de Domokos, os investigadores descobriram que os seixos marcianos perderam aproximadamente 20% da sua massa original.

Para traduzir a perda de massa em distância percorrida, a equipa contou com os dados recolhidos no Novo México e em experiências laboratorais anteriores desenhadas para calcular o desgaste mecânico induzido pelos leitos fluviais em rochas com diferentes composições. Depois de considerarem a composição dos materiais presentes no interior da cratera Gale e o efeito mais reduzido da gravidade de Marte, os investigadores concluíram que os seixos viajaram cerca de 50 km!

Estes resultados confirmam que os depósitos sedimentares observados pelo robot da NASA tiveram origem no cimo das montanhas da orla setentrional da cratera Gale e reforçam a ideia de que Marte poderá ter albergado no passado condições favoráveis à vida tal como a conhecemos. "Temos agora uma nova ferramenta que podemos usar para ajudar a reconstruir ambientes antigos na Terra, em Marte e noutros corpos planetários onde também encontramos rios, como [por exemplo] em Titã", explicou Jerolmack.

Podem encontrar todos os detalhes deste trabalho aqui.

sábado, 17 de outubro de 2015

Cassini envia imagens espetaculares do polo norte de Encélado

A região do polo norte de Encélado vista pela sonda Cassini, a 14 de outubro de 2015 (resolução aproximada de 35 metros/píxel).
Crédito: NASA/JPL-Caltech/Space Science Institute.

A Cassini enviou anteontem para a Terra as melhores imagens de sempre das latitudes mais setentrionais de Encélado. Captadas no seu mais recente encontro com a pequena lua de Saturno, as imagens revelam uma estranha paisagem crivada de crateras rasgadas por fraturas profundas.

As crateras Al-Haddar, Shahrazad e Dunyazad numa imagem captada pela Cassini, a 14 de outubro de 2015 (resolução aproximada de 60 metros/píxel).
Crédito: NASA/JPL-Caltech/Space Science Institute.

"As regiões setentrionais são cruzadas por uma rede de fendas muito finas que seccionam as crateras", disse Paul Helfenstein, investigador da Universidade de Cornell, nos Estados Unidos, e um dos membros da equipa de imagem da missão Cassini. "Estas fendas finas são ubíquas em Encélado, e vemos agora que também se estendem pelos terrenos no lado norte."

A Cassini tem agendado um novo encontro com Encélado no próximo dia 28 de outubro, desta vez sobre a região do polo sul. Durante o encontro, a sonda da NASA irá realizar uma passagem rasante através das plumas de vapor de água e partículas de gelo que se elevam nesta região. Com esta passagem, os cientistas esperam recolher dados que permitam uma visão mais detalhada dos processos geológicos responsáveis pela manutenção de um oceano global no interior da lua.

quarta-feira, 14 de outubro de 2015

Grande Mancha Vermelha de Júpiter continua a encolher

Mapa da atmosfera de Júpiter construído com imagens obtidas pelo telescópio espacial Hubble, a 19 de janeiro de 2015.
Crédito: NASA/ESA/Goddard/UCBerkeley/JPL-Caltech/STScI/adaptado por Sérgio Paulino.

Uma equipa de investigadores usou o telescópio espacial Hubble para produzir um conjunto de mapas detalhados da atmosfera tumultuosa de Júpiter. Estes novos mapas são os primeiros a serem produzidos pelo Outer Planet Atmospheres Legacy (OPAL), um projeto dedicado a criar uma série de retratos anuais dos 4 planetas gigantes do Sistema Solar, com o objetivo de ajudar os cientistas a compreender a evolução e dinâmica das atmosferas destes mundos distantes.

Os retratos agora divulgados foram construídos com imagens captadas pela Wide Field Camera 3 com um intervalo de 10 horas (aproximadamente o equivalente ao período de rotação de Júpiter), o que tornou possível a determinação da velocidade dos ventos jovianos e a identificação de fenómenos atmosféricos raramente observados no planeta. "Cada vez que olhamos para Júpiter, obtemos pistas intrigantes de que está a acontecer algo verdadeiramente emocionante", disse Amy Simon, investigadora do Centro de Voos Espaciais Goddard da NASA, nos Estados Unidos, e membro da equipa do projeto OPAL. "Esta vez não é exceção."

Movimento das nuvens de Júpiter num período aproximado de 10 horas. Em baixo são visíveis destacadas duas pequenas imagens da Grande Mancha Vermelha, em comprimentos de onda na banda do azul (à esquerda) e do vermelho (à direita).
Crédito: NASA/ESA/Goddard/UCBerkeley/JPL-Caltech/STScI.

As novas imagens confirmam que a Grande Mancha Vermelha (GMV) continua a encolher, mantendo assim a tendência que se tem verificado nas últimas duas décadas. A tempestade tem agora cerca de 16260 km de comprimento - aproximadamente menos 240 km do que tinha em 2014. Nos últimos 3 anos, o eixo maior da tempestade diminuiu a um ritmo superior ao de anos anteriores, no entanto as mudanças agora observadas são mais consistente com a tendência a longo prazo.

A GMV continua mais laranja do que vermelha, e o seu centro, normalmente com uma cor mais intensa, apresenta-se agora menos proeminente. Nas novas imagens podemos observar um fino filamento estendendo-se por quase a totalidade do comprimento do vórtice central. Esta estrutura roda e distorce-se no período de 10 horas que separa os dois conjuntos de imagens, movendo-se pela ação de ventos que sopram a velocidades entre os 360 e 540 km/h!

Estrutura em forma de onda observada na Cintura Equatorial Norte de Júpiter. Imagem em cores falsas obtida pelo telescópio espacial Hubble, a 19 de janeiro de 2015. As setas mostram a localização dos ciclones, enquanto que as barras indicam a onda.
Crédito: NASA/ESA/Goddard/UCBerkeley/JPL-Caltech/STScI.

Na Cintura Equatorial Norte, os investigadores descobriram ainda uma estrutura invulgar em forma de onda, até agora apenas observada em imagens do planeta captadas em 1979 pela sonda Voyager 2. Esta estrutura parece viajar numa região ponteada por ciclones e anticiclones e tem uma morfologia semelhante às ondas baroclínicas observadas na atmosfera terrestre, em locais onde se formam ciclones.

"Pensámos até agora que a onda observada pela Voyager 2 poderia ter sido uma mera casualidade", disse Glenn Orton, investigador do Laboratório de Propulsão a Jato, nos Estados Unidos, e membro da equipa responsável por este trabalho."Como se constantou, é apenas um fenómeno raro!" De acordo com os investigadores, a onda poderá ter origem numa camada límpida sob as nuvens, tornando-se apenas visível quando se propaga para o lençol de nuvens na camada superior.

Além de Júpiter, foram observados ainda Neptuno e Urano. Os mapas destes 2 planetas deverão ser disponibilizados em breve no arquivo público do projeto. Saturno será adicionado posteriormente. "É realmente emocionante o valor a longo prazo do programa OPAL", afirmou Michael H. Wong, investigador da Universidade da Califórnia, nos Estados Unidos, e membro da equipa responsável pelo trabalho. "A coleção de mapas que iremos acumular ao longo do tempo vai ajudar os cientistas a compreender não só a atmosfera dos nossos planetas gigantes, como também a atmosfera dos planetas que estão a ser descobertos em redor de outras estrelas, e a atmosfera e os oceanos da Terra, também."

Este trabalho foi publicado na semana passada na revista Astrophysical Journal e pode ser encontrado aqui.

domingo, 11 de outubro de 2015

A lua Estige vista pela New Horizons

A pequena lua Estige numa imagem obtida pela câmara LORRI da sonda New Horizons, a 14 de julho de 2015 (resolução aproximada: 3,1 km/píxel).
Crédito: NASA/JHUAPL/SwRI.

Chegaram finalmente à Terra as primeiras e únicas imagens de Estige captadas pela New Horizons durante a sua passagem pelo sistema plutoniano. Na altura, a sonda da NASA encontrava-se a 631 mil quilómetros de distância, pelo que as novas imagens revelam pouco mais que o tamanho e a forma desta pequena lua.

"Apesar de não parecer muito, as novas imagens revelam um satélite altamente alongado, com aproximadamente 7 km na sua dimensão mais longa e 5 km na sua dimensão mais curta", afirmou Hal Weaver, membro da missão New Horizons. O brilho de Estige, combinado com esta nova estimativa do seu tamanho, sugerem que a pequena lua tem uma superfície gelada altamente refletiva, semelhante ao que foi observado nas outras pequenas luas de Plutão, Nix e Hidra.

Estige vista pela New Horizons. Em baixo estão representadas as distâncias relativas das órbitas das luas de Plutão.
Crédito: NASA/JHUAPL/SwRI/adaptado por Sérgio Paulino.

Estige foi descoberta em 2012, em imagens captadas pelo telescópio espacial Hubble, e foi extensamente estudada ao longo de vários meses, durante a aproximação da New Horizons ao sistema plutoniano. Com estas novas imagens, os responsáveis da missão esperam desvendar mais detalhes acerca da forma e da rotação desta pequena lua. "Esperamos, no fim, aprender mais acerca das 4 pequenas luas de Plutão, de forma a compreendermos as suas semelhanças e diferenças, como se formaram e como evoluíram", disse o investigador principal da missão Alan Stern.

Ficam agora a faltar as imagens da lua Cérbero para que fique completo o retrato de família das luas de Plutão. As melhores deverão chegar dentro das próximas semanas e deverão ter uma resolução duas vezes superior à das imagens da lua Estige.

sábado, 10 de outubro de 2015

Rosetta observa evidências de um ciclo diário de gelo/vapor de água no cometa 67P/Churyumov–Gerasimenko

Mapas do gelo de água (esquerda) e temperaturas (direita) em Hapi, na superfície do cometa 67P/Churyumov–Gerasimenko. As imagens baseiam-se em dados obtidos pelo instrumento VIRTIS da sonda Rosetta, a 12, 13 e 14 de setembro de 2014.
Crédito: ESA/Rosetta/VIRTIS/INAF-IAPS/Obs. de Paris-Lesia/DLR/M.C. De Sanctis et al (2015).

Cientistas descobriram evidências do que há muito suspeitavam - os cometas têm um ciclo diário de gelo/vapor de água sincronizado com o seu período de rotação. Baseada em observações realizadas pelo instrumento Visible, InfraRed and Thermal Imaging Spectrometer (VIRTIS) da sonda Rosetta, a equipa de investigadores liderada por Maria Cristina De Sanctis do Instituto de Astrofísica e Planetologia Espacial de Roma, em Itália, identificou uma região na superfície do cometa 67P/Churyumov–Gerasimenko onde o gelo de água aparece e desaparece num padrão cíclico que segue as condições de iluminação locais. Esta descoberta foi publicada no passado mês de setembro na revista Nature.

Os cometas são corpos celestes compostos por uma amálgama de poeiras e gelos, sobretudo de água, dióxido de carbono, monóxido de carbono, metano e amoníaco. À medida que viajam em direção ao periélio, os cometas são aquecidos pela radiação solar, provocando o aquecimento das camadas superficiais e a consequente volatilização dos gelos aí expostos. Os gases libertados pelo calor irrompem violentamente através da superfície, e arrastam consigo partículas de poeiras e pequenos fragmentos de gelo, formando assim as caudas e cabeleiras características dos cometas.

A Rosetta alcançou o cometa 67P/Churyumov–Gerasimenko em agosto de 2014 e tem estado a estudá-lo desde então. No passado dia 13 de agosto, o cometa atingiu o periélio, e está agora a deslocar-se em direção à região mais exterior do Sistema Solar. Um dos principais objetivos da missão era, precisamente, o de monitorizar o aumento da atividade na superfície e em redor de 67P/Churyumov–Gerasimenko, durante a sua aproximação ao Sol.

Neste novo trabalho, os cientistas analisaram um conjunto de observações realizadas pelo instrumento VIRTIS, em setembro de 2014, numa região com cerca de 1 km2 localizada no "pescoço" do cometa. Na altura, o cometa encontrava-se a cerca de 500 milhões de quilómetros de distância do Sol e o pescoço era uma das regiões mais ativas.

"Descobrimos um mecanismo que devolve à superfície gelo fresco a cada rotação", explicou De Sanctis. "Isto mantém o cometa 'vivo'." O cometa leva cerca de 12,4 horas a completar cada rotação, pelo que as várias regiões na sua superfície passam por diferentes condições de iluminação ao longo desse período.

"Vimos a assinatura de gelo de água no espetro da região em estudo, mas apenas quando certas partes estavam na sombra.", acrescentou De Sanctis. "Por outro lado, quando o Sol brilhava nestas regiões, o gelo desaparecia. Isto indica um comportamento cíclico do gelo de água durante cada rotação do cometa."

Ciclo do vapor/gelo de água no cometa 67P/Churyumov–Gerasimenko.
Crédito: ESA/Adaptado por Sérgio Paulino.

Os dados obtidos pela Rosetta mostram que o gelo nas camadas superficiais do cometa sublima quando exposto à radiação solar, transformando-o em gás que escapa em direção ao espaço. À medida que a noite cai, a superfície volta a arrefecer rapidamente. No entanto, as camadas inferiores retêm ainda algum do calor que receberam durante o dia, pelo que a água aí aprisionada continua a sublimar e a seguir o seu caminho até à superfície através do interior poroso do cometa. À medida que alcança a superfície, o vapor de água congela mais uma vez, formando assim uma fina camada de gelo fresco. O ciclo reinicia mais uma vez sempre que o Sol ilumina de novo estas regiões.

"Já suspeitávamos que pudesse ocorrer este ciclo da água nos cometas, com base nos modelos teóricos e em anteriores observações de outros cometas, mas agora, graças à Rosetta e à sua extensa monitorização do cometa 67P/Churyumov–Gerasimenko, temos finalmente provas observacionais", disse Fabrizio Capaccioni, investigador principal do instrumento VIRTIS.

Baseados nestes dados, os investigadores puderam estimar a abundância relativa de gelo de água, no que diz respeito aos materiais que compõem o núcleo do cometa. O que descobriram foi que a água representa cerca de 10 a 15% dos materiais presentes nas camadas mais superficiais (até a alguns centímetros de profundidade) da região estudada, e parece estar bem misturada com outros constituintes.

A equipa usou ainda o sensor de micro-ondas MIRO para determinar a quantidade de vapor de água emitida pela região observada pelo VIRTIS. Os dados revelaram que, no período analisado, esta região produziu aproximadamente 3% da quantidade de vapor de água emitida pela superfície total do cometa. "É possível que várias áreas da superfície estivessem a passar pelo mesmo ciclo diário, providenciando assim contributos adicionais para a emissão total de gases do cometa", explicou Capaccioni.

A sonda europeia tem a capacidade de detetar alterações no cometa a curto e a longo prazo, pelo que os investigadores estão agora a analisar os dados recolhidos nos meses mais próximos do periélio para perceberem qual terá sido o efeito do aumento da atividade no ciclo de gelo/vapor de água. Apesar destes resultados iniciais fornecerem apenas um vislumbre do funcionamento interno do cometa 67P/Churyumov–Gerasimenko, os cientistas esperam, em breve, com a ajuda da Rosetta, esclarecer de uma forma mais clara o contributo deste e de outros processos na evolução dos cometas.

Podem ler mais sobre este trabalho aqui.