quinta-feira, 21 de janeiro de 2016

Confirmada a presença de gelo de água exposto na superfície do cometa 67P/Churyumov–Gerasimenko

Gelo de água exposto na região de Imhotep, na superfície do cometa 67P/Churyumov–Gerasimenko. Imagens obtidas em setembro de 2014 pela câmara da navegação da sonda Rosetta.
Crédito: ESA/Rosetta/NavCam – CC BY-SA IGO 3.0.

Observações divulgadas na semana passada pela equipa da missão Rosetta confirmam que duas das manchas brilhantes recentemente descobertas na região de Imhotep, na superfície de 67P/Churyumov–Gerasimenko, correspondem, de facto, a pequenas áreas com quantidades significativas de gelo de água exposto. Os dados foram obtidos entre setembro e novembro de 2014, pelo instrumento VIRTIS (Visible and Infrared Thermal Imaging Spectrometer), e revelam ainda que as camadas mais superficiais do núcleo do cometa são compostas principalmente por materiais escuros ricos em moléculas orgânicas, misturados com uma pequena quantidade de gelo de água.

O gelo identificado em Imhotep parece estar associado a depósitos de detritos acumulados na base de penhascos, e encontrava-se na altura a uma temperatura média de -120 ºC. Nestes locais foi detetada a presença de grãos de gelo de água puro em cerca de 5% da área de cada píxel da amostragem, sendo o restante constituído por materiais escuros e desidratados. Estes valores foram calculados com base na comparação entre as leituras realizadas pelo VIRTIS e modelos estatísticos que têm em conta a forma como os grãos de gelo de diferentes tamanhos se podem distribuir num único píxel.

A análise dos espetros obtidos em Imhotep permitiu ainda inferir a presença de duas populações distintas de grãos de gelo de água: uma com 33 a 72 µm de diâmetro, e outra de tamanho superior, entre 1,4 e 2,6 mm. Estas dimensões contrastam com os tamanhos inferiores anteriormente identificados nos grãos de gelo da região de Hapi, no "pescoço" do cometa.

Gelo de água junto a um penhasco em Imhotep, numa imagem obtida pelo instrumento VIRTIS na banda do infravermelho (em cima). Comparação com as temperaturas detetadas no mesmo local (em baixo).
Crédito: ESA/Rosetta/VIRTIS/INAF-IAPS/Observatório de Paris-LESIA/DLR; G. Filacchione et al. (2016).

"A existência de várias populações de grãos de gelo na superfície do cometa sugere a ocorrência de diferentes mecanismos de formação, e diferentes escalas temporais para a sua formação", disse Gianrico Filacchione, investigador do Instituto de Astrofísica e Planetologia Espacial, em Itália. Os grãos de gelo observados em Hapi parecem ter origem na fina camada de cristais de gelo formada ciclicamente, a cada rotação do cometa, a partir da rápida congelação do vapor de água que emerge das camadas subsuperficiais logo após o pôr-do-sol.

"Em contraste, os grãos de maiores dimensões que observamos na região de Imhotep têm uma história muito mais complexa" afirmou Filacchione. "A sua formação foi provavelmente lenta, sendo apenas ocasionalmente expostos pela erosão." Tendo em conta que os grãos de gelo presentes na superfície dos cometas têm dimensões tipicamente na ordem das dezenas de micrómetros, a observação de grãos de gelo com alguns milímetros de diâmetro pode ser explicada pelo crescimento de cristais de gelo secundários.

Uma das formas disto acontecer é através da sinterização - um processo no qual os grãos de gelo são compactados num só. Outra possibilidade é a dos cristais de gelo poderem ser criados a partir do congelamento do vapor de água expulso de camadas mais profundas do núcleo cometário pelo calor do Sol. Esta hipótese é suportada pelos resultados de experiências laboratoriais que simulam a sublimação de gelo escondido sob camadas de poeira submetidas à ação da luz solar. Estes testes mostram que mais de 80% do vapor de água libertado não consegue atravessar o manto de poeira, acabando por se depositar novamente nas camadas subsuperficiais.

"O crescimento dos grãos de gelo pode criar camadas mais profundas ricas em gelo com vários metros de espessura", explicou Fabrizio Capaccioni, investigador principal do instrumento VIRTIS. "[Estas camadas] podem depois afectar a estrutura em larga escala, incluindo a porosidade e as propriedades térmicas do núcleo. As finas camadas ricas em gelo que se encontram expostas nas proximidades da superfície podem ser uma consequência da atividade e evolução do cometa, o que implica que a estratificação global não ocorreu necessariamente durante as primeiras fases de formação do cometa."

A equipa da missão está agora a analisar os dados recolhidos numa fase posterior, quando o cometa se encontrava mais próximo do Sol, a fim de perceber de que forma evolui a quantidade de gelo de água exposto na superfície à medida que a temperatura aumenta.

Este trabalho foi publicado na revista Nature. Podem consultar o artigo aqui.

Sem comentários:

Enviar um comentário